Por que a Igreja Católica faz imagens se Êxodo 20 diz: “Não farás Imagem”?

Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro

Porque os católicos entendem que o mandamento que proíbe a confecção das imagens e que APENAS se aplicava às imagens de Deus, possui caráter parcialmente cerimonial.

Quando Deus Filho se encarna e se torna homem, a imagem [ícone] do Deus invisível (Hb 1:3) é apresentada diante dos olhos, e nosso relacionamento com as imagens muda. Essa resposta faz parte das verdades reveladas na Escritura e que foram abertas plenamente com o advento do Evangelho, e ocorre também com outras questões que possuíam um aspecto duplo e místico, tais como as obrigações de se sacrificar animais, as práticas ritualísticas em determinados dias e estações ou as restrições de diversas naturezas impostas aos judeus, tanto com respeito a indumentária quanto com respeito a certos alimentos. Leia sobre o sentido das regras cerimoniais no Velho Testamento aqui. É evidente que a ordenança de proibição da idolatria permanece, pois tem caráter moral, sendo qualquer católico proibido terminantemente de sacrificar a outros deuses ou adorá-los, mas a proibição de ver/representar Deus na pessoa do Seu eterno Filho caducou quando o Verbo, que é a Segunda pessoa da Trindade, assumiu a carne mortal no seio de Maria, se fazendo homem e visível. Por isso foi dito que trata-se de um mandamento “parcialmente” cerimonial, pois seu aspecto moral ainda se mantém, tal como ocorre com o mandamento de guardar o Sabbath, cujo elemento moral persiste. Assim declara o Catecismo 2176: “A celebração do domingo é o cumprimento da prescrição moral, naturalmente inscrita no coração do homem, de «prestar a Deus um culto exterior, visível, público e regular, sob o signo da sua bondade universal para com os homens”.

Se quer entender mais, considere:

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A MUDANÇA NA ECONOMIA DAS IMAGENS
COM A ENCARNAÇÃO É RESULTADO DA MUDANÇA NO RELACIONAMENTO ENTRE DEUS E OS HOMENS

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Há Razões para se crer na Interpretação Restritiva de Êxodo 20 na Escritura

 

O QUE NÃO MUDOU FORAM AS IMAGENS COM OBJETIVO ICÔNICO. COM EXCEÇÃO DA REPRESENTAÇÃO DA DIVINDADE. “Não farás ídolo” (distorção que desvia os homens de Deus). Mas pode fazer ícone (janela que leve os homens a glorificar a Deus).

Deve-se reconhecer que no cristianismo elementos do judaísmo da Antiga Aliança foram recebidos e transformados à luz da Encarnação e Ressurreição de Cristo.

Isso pelo fato de ser parte essencial da Fé cristã a noção de que Deus se encarnou, por ser a implicação lógica de um ensino que torna o Cristianismo único: a Encarnação. Essa doutrina ensina que Deus se fez carne/homem e esteve entre nós, assumindo a nossa natureza humana. Para Deus assumir a matéria, fazendo-se carne mortal, foi imprescindível que se fizesse visível, isto é, uma imagem (coisa impossível a um espírito). refletida perante a retina de todo homem que o visse. E como toda matéria, passível de representação, seja a partir de um desenho ou pintura, seja a partir de uma imagem erigida. Como diria o profeta Isaías:”olhando nós para ELE, não víamos parecer nem formosura…” se sua imagem não pudesse ter sido contemplada profeticamente por ele e visualmente/virtualmente/realmente pelos apóstolos e por aquelas testemunhas oculares que o viram? Não seria possível assumir que Deus se encarnou sem essa necessidade básica da matéria. A qualidade de ser vista. Uma das grandes polêmicas com respeito ao Deus do Velho Testamento, por exemplo, é o texto de Moisés dizendo que Ele não tinha forma. A incapacidade de ser traduzido em forma visível e circunscrita é um dos grandes óbices aos judeus aceitarem a cristologia. Deus é infinito e se colocou no tempo finito e limitado. Deus se encarnou. Ele fez para si uma imagem. Sobre essa questão de ir pro inferno, o catolicismo é muito flexível até com pessoas fora de sua jurisdição, imagina com pessoas que não estão dispostas a fazer imagem por algum impedimento da consciência.

O erro que acuso nos iconoclastas é a clara contradição com a ideia de circunscrição e de visibilidade. Coisa condenada no V. T. Os católicos têm uma resposta para isso, mas vcs não. Para nós, a proibição era pq a lei era cerimonial. Tal como o Sábado. Permanece a norma moral contra os ídolos, mas não a proibição quanto à pessoa divina. Embora a Divindade, conforme S. João Damasceno, não seja passível de representação.
Mas os católicos representam a hipóstase.
Deus flexibilizou o Mandamento

Cristo, ao assumir um corpo, ficou delimitado e apresentável/representável. Coisa impossível a um Deus essencialmente inatingível e espiritualizado sem contato com a matéria. Isso é inclusive parte da redenção humana: o fato de Deus ter se tornado parte de nossa realidade, torna possível que nos comuniquemos, da parte dele nos concedendo dons, e de nossa parte, tendo Ele assumido a nossa carne. Não pode ser considerada No Sequitur pq tudo q disse se segue. Embora vc e os demais protestantes não vejam que há uma necessária implicação, ela existe. Pois se Deus não fosse quem tornou isso possível, como alguém ousaria fazer? O mandamento, se não era uma norma absoluta, então o que era? Quando olhamos para Deus, o Deus do Antigo Testamento, sem rosto, poderíamos nos contentar com essa ideia. Mas não é possível no Novo, com um Deus-homem. Quando alguém lê a Escritura, um batismo é mencionado, por exemplo. O que vem à mente quando cita-se uma pomba vindo do céu? Um rio – dois homens – uma pomba. Tudo isso é trazido em imagens em nossa mente. Mesmo quando não podemos dizer que sabemos a aparência exata dos dois homens. Logo a imagem padrão de homem que temos em nosso acervo memorial surge. E construímos uma imagem. Vamos então dizer que nós dois assumimos que Deus fez Imagem de Si ao se Encarnar. Vc estaria negando a Física se o fizesse e a Ótica é um ramo da Física que estuda a Luz e as imagens e veja como é descrita uma imagem pela Física. Uma imagem pode ser definida como aquele ponto, onde os raios de luz vindos de um OBJETO se encontram ou parecem se encontrar após reflexão ou refração. Nesta definição, a palavra “objeto” pode ser definida como qualquer coisa da qual raios de luz estão vindo. Cristo, ao se fazer Carne, se fez o OBJETO sobre o qual os raios de luz incidem produzindo uma imagem em consequência. Ponto. Concordamos com isso. Mas vc me acusa de negar a lógica quando eu assumo que ao fazer isso, Deus nos deu permissão para fazer imagens dele, já que nosso próprio corpo faz isso naturalmente por meio da retina. E isso exige agora uma explicação biológica do processo de visão humana. Mas acredito q vc conhece. Então vc diz:”não é uma necessidade que façamos imagens (de outra natureza que não 1. Aquela formulada por nosso cérebro- no caso das testemunhas oculares de Jesus no passado; e 2. Aquela que é formulada também naturalmente pelo nosso cérebro quando lemos a bíblia na forma de uma IMAGEM PSÍQUICA). É válido o argumento, mas os católicos entendem que isso se tornou um testemunho da Encarnação. O seu argumento é que Deus podia, mas nós não. Seria aceitável, se resolvesse o problema que isso cria. Talvez buscar apelar para o ex lex, mas vejo como uma tese ruim. Deus não faria se fosse essencialmente mau por sua natureza.

 

O Caráter Cerimonial do Mandamento é manifesto na Encarnação

 

Uma demonstração de que esse caráter do mandamento não era moral, foi o fato de ele ter sido flexibilizado, tal como o Sábado. Em razão disso, os teólogos chegaram à conclusão lógica de que se tratava de um mandamento de caráter parcialmente cerimonial. Mas o que é caráter cerimonial? É um mandamento de caráter transitório, provisório ou temporal, que tinha por objetivo nos revelar mensagens eternas através de ordenações esquemáticas. Tal era a natureza dos sacrifícios de cordeiros, das proibições alimentares, dos descansos sabáticos em variados tipos de intervalo de tempo, etc. A imagem é algo que pode ser comunicado pelo elemento do “gesso”, mas imagem vai além do instrumental utilizado pelo homem para comunicá-la: o Gesso e a Carne… em que diferem? Se usarmos os termos químicos, poderemos nos ater a muita coisa com essa questão, mas se tomarmos ambos como matéria em seu mais claro conceito, podemos chegar mais longe e mais rápido. Toda matéria produz naturalmente uma imagem em contato com a luz. Deus se fez matéria. Uma vez que isso se deu, o mandamento foi flexibilizado, então não pode ser um mandamento moral/eterno.

 

A Maioria dos críticos das Imagens relativizam o Mandamento e não o cumprem

 

Boa parte dos críticos aceita que se façam imagens (os iconistas), mas não admitem a outra parte proibida do mandamento: a veneração. Ora, isso é uma incoerência e uma relativização da ordem divina [se é que esta é a interpretação correta], pois o mandamento trouxe duas regras: 1) “Não faça” e 2) “não se curve”. Se alguém considera a interpretação abrangente do termo imagem [leia acima], deve ser coerente o suficiente para não aceitar nenhuma confecção, porém poucos estão dispostos a abraçar tal rigorismo. Checamos isso facilmente quando nos damos conta de que Christopher Powers, artista do Full of Eyes que é um protestante de confissão calvinista, está disposto a flexibilizar a primeira parte do mandamento ao fazer suas representações de Cristo. Isso já mostra que há um problema lógico com a interpretação teológica que muitos grupos fazem de êxodo 20.

 

Foto de James Coleman na Unsplash

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Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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