Estamos chegando à Páscoa! Bom, para quem acha que isso significa ‘ovos de chocolate de montão’, devo dizer que sua explicação é mais profunda. A Páscoa é um feriado de origem judaica, criado há muito, muito tempo mesmo, e que apesar de ser comemorado por este povo ainda hoje, para nós tem um sentido muito mais amplo e espiritualizado do que para eles. Os judeus ainda esperam o Messias. Eles aguardam a revelação de um líder ungido enviado por Deus para salvar seu povo, dando-lhe vitória sobre os inimigos. Nós, cristãos, no entanto, acreditamos que este homem já veio, e que concedeu libertação, não somente para judeus, mas para o mundo inteiro. Apesar das significativas e conhecidas diferenças existentes entre as duas religões, no entanto, ainda temos a Páscoa em comum, mesmo que ela assuma diferentes sentidos para ambas. Vamos falar um pouco sobre isso aqui. Essa data começou para os judeus quando Deus a instituiu a Moisés como mandamento, significando a comemoração da saída e libertação da escravidão do Egito. A enciclopédia judaica assinala:
O festival comemora a libertação dos primogênitos de Israel do julgamento exercido sobre os egípcios (Êxodo 12: 12-13; comp. Êx. 13: 2, 12 e seguintes.), e a maravilhosa libertação dos hebreus da Escravidão egípcia […] De acordo com Êxodo 12, este rito foi instituído por Moisés no Egito, em antecipação ao julgamento que estava prestes a ocorrer sobre Faraó e seu povo. No décimo dia do mês – se tornando, a partir de então, o primeiro mês do ano – os hebreus deveriam pegar um cordeiro para cada família, “sem defeito, e um macho do primeiro ano”, “das ovelhas ou das cabras”. ” Mantido até o décimo quarto dia, este cordeiro foi morto “na véspera” (“ao pôr do sol”; Deuteronômios 16: 6), seu sangue sendo aspergido por meio de um “molho de hissopo” (Êxodo 12: 22) nos dois umbrais das portas e nos lintéis das casas onde os hebreus se reuniam para comer o cordeiro durante esta noite, denominada “a noite das vigílias a Yhwh” […] O cordeiro deveria ser assado no fogo, não fervido em água ou deixado cru; sua cabeça, pernas e vísceras não deveriam ser removidas, devendo ele ser comido com ervas amargas e pães ázimos. Nada deveria sobrar até de manhã; e tudo o que restasse deveria ser queimado (Êxodo 12). Os detalhes deste rito observado no Egito estão resumidos na “ordenança da Páscoa” (Êxodo 12: 43 e seguintes). Nenhum osso deveria ser quebrado; a refeição deveria ser realizada dentro de uma casa; nenhum estrangeiro poderia participar; e a circuncisão era um pré-requisito no caso de servos comprados por dinheiro e de estrangeiros desejando tomar parte (Êxodo 12: 44-48).
PÁSCOA JUDAICA: O VELHO TESTAMENTO.
Deus faz uma aliança com o povo israelita.

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Ao décimo dia deste mês tomará cada um para si um cordeiro, segundo as casas dos pais, um cordeiro para cada família. […]
Êxodo 12: 3
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VERSÍCULOS 5-7 diz:
O cordeiro, ou cabrito, será sem defeito*[1], macho de um ano, o qual tomareis das ovelhas ou das cabras, […] e toda a assembleia da congregação de Israel o matará à tardinha: Tomarão do seu sangue, e o colocarão em ambos os umbrais e na verga da porta das casas em que estiverdes e de quem comeu dele. E acontecerá que o sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes; (v. 13)
VERSÍCULO 27:
Este é o sacrifício da Páscoa do Senhor, que passou as casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os primogênitos dos egípcios, mas livrou as nossas casas, por causa do sangue do cordeiro.
SOMBRAS DE COISAS ETERNAS
Todos conhecem a história. Faraó, um tirano, não deixava o povo de Deus livre e impedia sua partida à Terra Prometida, mas Deus enviou Moisés e as 10 pragas, dentre as quais a pior delas era a Morte dos Primogênitos. De todas elas Deus livrou os filhos de Jacó, mas esta última exigia que o povo Israelita sacrificasse um cordeiro escolhido do rebanho, o comesse e aspergisse seu sangue nos umbrais e na verga de suas portas. O Anjo passaria por eles e não feriria os filhos de Israel, por conta dessa aliança e sinal. Então, em agradecimento e obediência, todos os anos se passou a comemorar a Páscoa entre os israelitas, para bendizer a Deus e pedir perdão pelos pecados. Toda a cerimônia é realizada pelo sacerdote. Paulo disse que os eventos do Velho Testamento revelados particularmente aos judeus são figuras e sombras de coisas eternas que Deus preparou para toda a Humanidade (1 Coríntios 10.6). É nisso que os cristãos acreditam. Ao dizer ‘figuras’, contudo, o apóstolo quis dizer que Deus usou símbolos e pistas nos tempos antigos, o que não significa que tais eventos não aconteceram, mas apenas que a realidade deles foi usada como instrumento e reflexo de uma mensagem. Esses acontecimentos deveriam cumprir um plano programado, uma observância que revelava um caminho.
DEUS PLANEJAVA SALVAR O MUNDO TODO
O profeta Isaías registrou duas tarefas importantes que deveriam ser realizadas pelo Messias, isto é, pelo Servo do Senhor, as quais não se excluem, mas são complementares entre si. E uma delas envolve os não judeus. É importante destacar que apesar de a interpretação comum acerca da identidade do Servo sofredor fornecida pelos judeus ser de que Isaías se referia ao próprio povo de Israel quando o mencionava, tal concepção não é muito lógica, se analisarmos os versos de forma atenciosa, sobretudo o mencionado abaixo, que indicaria necessariamente que ele seria outra pessoa. Ora, o Servo não pode ser ao mesmo tempo as tribos dispersas de Israel e também aquele que as ajunta e as reconduz. O Servo, sendo uma pessoa particular, parece mais adequado, uma vez que é Ele quem restaura as tribos de Jacó ao seu estado anterior de paz com Deus. Logo, o servo sofredor deve ser alguém particular e não o próprio povo coletivamente, disperso e fugidio, por quem intercede e se sacrifica como oferta pelo seu pecado em Isaías 53. Veja:
Disse-me: “Não basta que sejas meu servo para restaurar as tribos de Jacó e reconduzir os fugitivos de Israel; vou fazer de ti a luz das nações, para propagar minha salvação até os confins do mundo”.
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Logo, Deus tinha um plano de inserir os gentios na Aliança desde o começo:
1. Restaurar as tribos de Jacó
2. Ser luz das nações
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O profeta Malaquias também menciona um sacrifício que seria oferecido ao Deus único e verdadeiro por parte das nações do mundo inteiro, e este seria agradável ao Senhor, que teria seu nome conhecido e engrandecido pelos povos até os confins da terra:
Porque, do nascente ao poente, meu nome é grande entre as nações e em todo lugar se oferecem ao meu nome o incenso, sacrifícios e oblações puras. Sim, grande é o meu nome entre as nações – diz o Senhor dos exércitos.
Foto de Daniel Sandvik na Unsplash
Ovelha muda ao matadouro Is 53: 7
Em outro trecho de Isaías, temos uma pista de que tipo de sacrifício seria esse mencionado por Malaquias:
6 Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um se desviava pelo seu caminho; mas o Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós.
7 Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a boca; como um cordeiro que é levado ao matadouro, e como a ovelha que é muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a boca.
8 Pela opressão e pelo juízo foi arrebatado; e quem dentre os da sua geração considerou que ele fora cortado da terra dos viventes, ferido por causa da transgressão do meu povo?!
9 E deram-lhe a sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte, embora nunca tivesse cometido injustiça, nem houvesse engano na sua boca.
10 Todavia, foi da vontade do Senhor esmagá-lo, fazendo-o enfermar; quando ele se puser como Oferta pelo Pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias, e a vontade do Senhor prosperará nas suas mãos.
Isaías 53
Aparentemente, de acordo com os versos acima, Deus queria fazer algo maior (1 Co 13: 11 e Gl 4: 3- 5). Por isso, as figuras e sombras foram o meio de preparação, mas não a completude. O escritor de Hebreus disse que os primeiros chamados por Deus, isto é, os patriarcas, homens de fé no Velho Testamento e profetas, viram a promessa de longe, e mesmo sem alcançar seu pleno cumprimento com a vinda do Messias, ainda assim creram. (“Foi na fé que todos os nossos pais morreram. Embora sem atingir o que lhes tinha sido prometido, viram-no e o saudaram de longe, confessando que eram só estrangeiros e peregrinos sobre a terra” – Hb 11: 13). Por quê? Ele prossegue: “Porque Deus, que tinha para nós uma sorte melhor, não quis que eles chegassem sem nós à perfeição” (v. 40). Isso prova que revelar essas coisas ao povo judeu, e antes, a Abraão (Gn 18:17- 18; Jo 15:15 e Gl 3:8) foi importante. Com isso, Deus, por meio de figuras, revelou Cristo àqueles que amou e com quem fez uma aliança, ou seja, a posteridade. Mas apesar de revelar sua meta, Ele não fez de modo claro (os que eram espirituais puderam compreender, mas quem não era, não percebeu. Cf. Gl 3: 16). É o caso, por exemplo, de quando o Senhor ordena a Abraão que execute seu único filho Isaque, e em seguida, impede o ato providenciando a seu amigo um cordeiro preso pelo chifre no meio dos abustos e espinhos (Gênesis 22: 7-13). O cordeiro deveria morrer como oferta em favor de Isaque, o que é familiar à descrição de Isaías, não? Assim, a instituição da Páscoa parecia embrionária na época de Abraão, mas já estava ali, escondida.
PÁSCOA CRISTÃ: O NOVO TESTAMENTO.
Deus faz uma aliança com toda a humanidade.
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Pois este é o meu sangue, o sangue do pacto, o qual é derramado por muitos para remissão dos pecados.
Mt 26: 28
Tomou em seguida o pão e depois de ter dado graças, partiu-o e deu-lho, dizendo: “Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim”. Do mesmo modo tomou também o cálice, depois de cear, dizendo: “Este cálice é a Nova Aliança em meu sangue, que é derramado por vós.
Lc 22: 19-20
Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
Ele é a expiação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo.
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Para nós, que somos participantes do NOVO TESTAMENTO, estas coisas nos foram reveladas como Espirituais e Eternas. Este é o sangue da Nova Aliança, aquela que foi feita por Deus com os homens a partir do sangue do homem Jesus, chamado de “sangue de Deus” (Atos 20: 28), não de animais. Trata-se de lembrarmo-nos do sacrifício de Cristo, o verdadeiro cordeiro e messias, que teve seu sangue derramado por nós e pelo Mundo inteiro para perdão dos pecados, e seu corpo partido e ferido, com o fim de revelar o grandioso plano de Deus, de salvação dos homens e participação na natureza divina: “Bem Aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras no sangue do cordeiro, para que tenham direito à Árvore da Vida e possam entrar na Cidade pelas Portas” (Ap 22: 14) e “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai que me enviou vive, e eu vivo pelo Pai, assim também aquele que comer a minha carne viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que vossos pais comeram e morreram. Quem come deste pão viverá eternamente” (João 6: 56-58).
A DIFRERENÇA ENTRE A PÁSCOA JUDAICA E A PÁSCOA CRISTÃ
Ao lermos sobre a Liturgia judaica e a liturgia cristã, atestamos claras diferenças quanto ao calendário seguido, todavia, ambas possuem essa data em comum, ou seja, ambos os seguimentos religiosos celebram devotamente a Páscoa como uma festividade sagrada e um vínculo forte entre as duas religiões. Ainda assim, no entanto, como fica claro a partir do estudo das Escrituras citadas e do Catecismo, a Igreja ressignificou essa festa por causa de Cristo e dos eventos do Novo Testamento. Inclusive temos, por exemplo, a observância da Quaresma, que é um período de 40 dias de jejum e penitências em preparação para a Páscoa, o qual tem por objetivo unir os nossos propósitos ao de Nosso Senhor Jesus em memória ao tempo que passou no deserto, quando suportou as tentações e privações preparando-se para seu ministério terreno: “Todos os anos, pelos quarenta dias da Grande Quaresma, a Igreja une-se ao mistério de Jesus no deserto” (CIC 540). É uma forma de meditarmos nos eventos que envolveram a redenção da Humanidade, e nos unirmos ao nosso esposo em seus sofrimentos. Tudo isso ocorre antecipando a Páscoa:
1095. É por isso que a Igreja, especialmente por ocasião dos tempos do Advento, da Quaresma e sobretudo na noite da Páscoa, relê e revive todos estes grandes acontecimentos da história da salvação no «hoje» da sua liturgia.
A relação entre a liturgia judaica e a liturgia cristã, como igualmente a diferença dos respectivos conteúdos, são particularmente visíveis nas grandes festas do ano litúrgico, como a Páscoa. Tanto os cristãos como os judeus celebram a Páscoa: a Páscoa da história, virada para o futuro, entre os judeus: a Páscoa consumada na morte e ressurreição de Cristo, entre os cristãos – embora sempre na esperança da sua consumação definitiva.
A EUCARISTIA E A PÁSCOA
O Catecismo ensina que “o mistério de Cristo, a sua Encarnação e a sua Páscoa, são celebrados na Eucaristia” (CIC 1174). Isso indica que há um sentido próximo na celebração cristã do sacrifício da Missa também em razão do elemento da ceia, que se aproxima daquele celebrado pelos judeus anualmente na Páscoa. O fato de os cristãos acreditarem comer o corpo de Cristo, cordeiro de Deus sacrificado, indica muita coisa. Ainda assim, no entanto, a concepção cristã se agiganta e engloba totalmente o elemento judaico, de modo a não poder ser equiparado a ele, posto ser maior, mas, ainda assim, manter similaridades características. É mesmo quase (se posso dizer) uma realação a nível de um parentesco. Os israelitas deveriam comer do cordeiro e usar seu sangue para sinal. A celebração cristã veio da Páscoa judaica, mas não se prende a ela, reclamando tratar-se de seu pleno cumprimento. Seu sentido é mais vasto e profundo, sobretudo quando consideramos as palavras transcendentes de Paulo:
Purificai-vos do velho fermento, para que sejais massa nova, porque sois pães ázimos,
porquanto Cristo, nossa Páscoa, foi imolado.
1 Coríntios 5: 7
Veja o que o apóstolo declara: vocês são o pães (ázimos) e por isso devem purificar-se. Nesse sentido, os próprios fiéis da humanidade inteira se tornam a oferta a Deus na medida em que “comem do único pão partido, Cristo, entram em comunhão com Ele e formam um só corpo n’Ele” (CIC 1329). O Catecismo vai além, ao declarar que a Missa “atualiza o único sacrifício de Cristo Salvador e inclui a oferenda da Igreja […] além de completar e ultrapassar todos os sacrifícios da Antiga Aliança” (CIC 1330). Porque Jesus escolheu a altura da Páscoa para cumprir o que tinha anunciado em Cafarnaum: dar aos seus discípulos o seu corpo e o seu sangue” (CIC 1339):
1334. Na Antiga Aliança, o pão e o vinho são oferecidos em sacrifício entre as primícias da terra, em sinal de reconhecimento ao Criador. Mas também recebem uma nova significação no contexto do Êxodo: os pães ázimos que Israel come todos os anos na Páscoa, comemoram a pressa da partida libertadora do Egipto; a lembrança do maná do deserto recordará sempre a Israel que é do pão da Palavra de Deus que ele vive (166). Finalmente, o pão de cada dia é o fruto da terra prometida, penhor da fidelidade de Deus às suas promessas. O «cálice de bênção» (1 Cor 10, 16), no fim da ceia pascal dos judeus, acrescenta à alegria festiva do vinho uma dimensão escatológica – a da expectativa messiânica do restabelecimento de Jerusalém. Jesus instituiu a sua Eucaristia dando um sentido novo e definitivo à bênção do pão e do cálice.
1340. Celebrando a última ceia com os seus Apóstolos, no decorrer do banquete pascal, Jesus deu o seu sentido definitivo à Páscoa judaica. Com efeito, a passagem de Jesus para o seu Pai, pela sua morte e ressurreição – a Páscoa nova – é antecipada na ceia e celebrada na Eucaristia, que dá cumprimento a Páscoa judaica e antecipa a Páscoa final da Igreja na glória do Reino.
JESUS CELEBROU A PÁSCOA?
No primeiro dia dos Ázimos, em que se imolava a Páscoa, perguntaram-lhe os discípulos: “Onde queres que preparemos a refeição da Páscoa?”. Ele enviou dois de seus discípulos, dizendo: “Ide à cidade, e vos sairá ao encontro um homem, carregando um cântaro de água. Segui-o e, onde ele entrar, dizei ao dono da casa: O Mestre pergunta: Onde está a sala em que devo comer a Páscoa com os meus discípulos? E ele vos mostrará uma grande sala no andar superior, mobiliada e pronta. Fazei ali os preparativos”. Partiram os discípulos para a cidade e acharam tudo como Jesus lhes havia dito, e prepararam a Páscoa.
A Páscoa aparece sendo celebrada de forma explícita três vezes no ministério público de Jesus, o que fica registrado na Bíblia: João 2:13, João 6:4 e João 13:1. Isso confirma os três anos em que Jesus celebrou com seus apóstolos a Páscoa conforme os moldes judaicos antes de instituir a Eucaristia e o Novo Testamento, e vemos isso a partir dos relatos dos Evangelhos sinóticos Mateus, Marcos e Lucas; e João. Há, todavia, certa dúvida envolvendo os detalhes da celebração pascoal por parte dos apóstolos e Jesus. Nos Evangelhos sinóticos, isto é, nos três primeiros citados, Jesus oferece a Ceia “no primeiro dia dos pães ázimos, quando sacrificavam o cordeiro pascal” (Marcos 14:12, Mateus 26:17, Lucas 22:7). Ou seja, Ele celebrou a primeira Missa na quinta-feira em 14 de nisã: “dia de preparação” para a Páscoa”. Nesse dia, os cordeiros eram mortos e a ceia era preparada para ser comida à noite, conforme a descrição bíblica em Êxodo 12:6. O evangelho de João, porém, nos relata Jesus sendo crucificado no “dia da preparação” em João 19:31, sexta-feira 14 de nisã, o dia da preparação. O sábado então seria a Páscoa conforme João. Alguns dizem que isso é uma contradição, mas Tim Staples, do Catholic Answers, resolveu esse dilema explicando o contexto judaico da época, e as disputas entre datas nos diferentes ramos religiosos:
[…] podemos simplesmente olhar para o calendário judaico e ver que no ano 30 d.C., a Páscoa caiu na sexta-feira. Isso dá credibilidade à teoria de que o ministério de Jesus durou três anos. E lembre-se, isso significa que o décimo quarto dia de nisã teria sido quinta-feira. Este era o dia da preparação, quando o cordeiro era morto e a refeição da Páscoa era comida à noite. O povo judeu contava seus dias começando da noite do dia anterior. O verdadeiro dia da Páscoa é o décimo quinto dia de Nisã. O único outro ano que estaria próximo de 30 d.C. em que a Páscoa teria ocorrido na sexta-feira foi 33 d.C. […] Sabemos com certeza que nosso Senhor morreu na sexta-feira (cf. Mateus 27:62, Marcos 15:42, Lucas 23:54 e João 19:31). Sabemos que ocorreu no mês de Nisã (abril) porque era a época da Páscoa. Mas a pergunta permanece: por que nos Evangelhos sinóticos Jesus celebra a Páscoa na noite de quinta-feira (e, claro, considerando o fato de que a Páscoa caiu na sexta-feira daquele ano, isso seria esperado), mas no Evangelho de João, sexta-feira é “o dia da preparação”? Segundo João, a Páscoa caiu no sábado, e é por isso que ele se refere a ela como um “grande sábado” (cf. João 19:31). Não era apenas o sábado, mas também a Páscoa. Ainda temos de lidar com esta aparente contradição. De acordo com a Bíblia de Estudo de Navarra, no Evangelho de Marcos os fariseus e saduceus tinham uma maneira diferente de celebrar os dias de festa (51-52). Os fariseus eram rigorosos na sua observância. Se o dia quinze de nisã caísse na sexta-feira, então esse seria o dia em que eles celebrariam a Páscoa. Os saduceus, por outro lado, eram mais liberais e não tinham problemas em mudar um dia de festa em determinadas situações. Esta prática é análoga à nossa prática moderna de transferir alguns dias de festa para o domingo, quando na verdade eles ocorrem durante a semana (como é comumente a prática com respeito à festa da Epifania). Também poderia ser comparado aos bispos que declaram que um dia santo não é obrigatório por causa do dia em que ele cai. Por exemplo, se um dia santo cair numa sexta-feira, os bispos dispensarão por vezes os católicos da obrigação de assistir à missa nesse dia santo específico daquele ano. O que tudo isso significa? Quando Jesus de fato celebrou a Páscoa, ele o fez da maneira tradicional dos fariseus. É isso que vemos nos Evangelhos sinóticos. Com os fariseus, Jesus celebrou a Páscoa estritamente de acordo com o que Moisés disse em Êx. 12. Contudo, quando João escreveu sobre a paixão de Cristo, ele não colocou a ênfase na Ceia do Senhor como fazem os escritores dos Evangelhos sinóticos. Na verdade, ele não menciona a Ceia do Senhor. Ele enfatiza a crucificação. Apenas de passagem, ao descrever a atividade do dia, João menciona que era “o dia da preparação”. João não estava falando da prática de Jesus e dos apóstolos; ele estava falando da prática dos saduceus, que tinham um grande número de sacerdotes em seu acampamento e grande influência na cultura da época. Este fato explica por que João chama a sexta-feira de “dia de preparação” em vez de quinta-feira. Os saduceus, que mudaram a Páscoa para o sábado, celebravam o dia da preparação na sexta-feira, em vez de na quinta-feira, como Jesus e os apóstolos fizeram.
The Last Supper – Leonardo Da Vinci
Domínio Público
FELIZ PÁSCOA
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NOTAS
[1] *Por isso as Escrituras sempre focam no fato de Jesus nunca ter pecado, nem haver qualquer engano nem injustiça em sua boca.
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