Já no Antigo Testamento, os indivíduos culpados de vários tipos de pecados – os pecados cometidos deliberadamente, (75) as diversas formas de impureza, (76) a idolatria,(77) o culto a falsos deuses (78) – eram ordenados a serem “levados longe do povo”, o que também poderia significar ser condenado à morte. (79) Em contraste com estes havia outros pecados, especialmente pecados cometidos por ignorância, que foram perdoados por meio de uma oferta de sacrifício (Lv 4:2; 5:1; Nm 15:22-29). Referindo-se também a estes textos, a Igreja tem falado durante séculos do pecado mortal e do pecado venial. Mas é sobretudo o Novo Testamento que esclarece esta distinção e estes termos. Aqui há muitas passagens que enumeram e reprovam fortemente pecados que são particularmente merecedores de condenação. ( Mt 5:28; 6:23; 12:31; 15:19; Mc 3:28-30; Rom 1:29-31; 13:13; Jas 4.) Há também a confirmação do Decálogo pelo próprio Jesus ( Mt 5:17; 15:1-10; Mc 10:19; Lc 18:20.) Aqui desejo dar especial atenção a duas passagens que são significativas e impressionantes.
Numa passagem da sua primeira Carta, São João fala de um pecado que leva à morte (pròs thánaton) em contraposição a outro pecado que não leva à morte (mè pròs thánaton). (Jn 5:16) No conceito de morte, aqui, como é óbvio, subentende-se espiritual: trata-se da perda da verdadeira vida ou «vida eterna», que, para São João, é o conhecimento do Pai e do Filho e a comunhão e a intimidade com eles. O pecado que leva à morte parece ser, nesta passagem, a negação do Filho, (1 Jn 2:22) ou o culto de falsas divindades. (1 Jn 5:21) Seja como for, com essa distinção de conceitos, São João parece querer acentuar a incomensurável gravidade daquilo que é a essência do pecado, a recusa de Deus, atuada sobretudo na apostasia e na idolatria; ou seja, no repúdio da fé na verdade revelada e na equiparação a Deus de certas realidades criadas, erigindo-as em ídolos ou falsos deuses. Mas o Apóstolo, nessa mesma página, quer também pôr em evidência a certeza que provém para o cristão do fato de ser «nascido de Deus» pela vinda do Filho: há nele uma força que o preserva da queda no pecado; Deus guarda-o «e o Maligno não o toca».
No caso de pecar por fraqueza ou ignorância, subsiste nele a esperança da remissão, também pelo apoio que lhe advém da oração feita em conjunto pelos irmãos. Noutra página do Novo Testamento, no Evangelho de São Mateus, (Mt 12:31) o próprio Jesus fala duma «blasfémia contra o Espírito Santo», que é «irremissível», porque, nas suas manifestações, ela aparece como uma obstinada recusa de conversão ao amor do Pai das misericórdias. Trata-se, é claro, de expressões extremas e radicais: rejeição de Deus, rejeição da sua graça e, portanto, oposição ao próprio princípio da salvação, (Thomas Aquinas, Summa Theologiae II-II, q. 14, aa. 1-8.) pela qual o homem parece fechar voluntariamente a si mesmo o caminho da remissão.
O purgatório é apenas uma das vias purgativas que Deus usa para santificar. Ela não é a melhor, nem a mais recomendável, posto que é um remédio extremo. Por exemplo, os santos devem ser purificados pela mortificação e pela disciplina em suas vidas. Todavia, essa é a regra, buscar ser moldado a Cristo através das múltiplas situações que Deus nos dá para aprendermos, mas a exceção é a salvação de uma pessoa que não aproveitou bem esses meios de graça e correções que Deus providenciou.




