E se 1 Coríntios 3: 13-15 tratar de Recompensas aos Ministros?

Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro

Isso ainda assim não oferece oposição ao purgatório.
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13. a obra de cada um aparecerá. O dia (do julgamento) irá demonstrá-lo. Será descoberto pelo fogo; o fogo provará o que vale o trabalho de cada um.

14.Se a construção resistir, o cons­trutor receberá a recompensa.

15.Se pegar fogo, arcará com os danos. Ele será salvo, porém passando de alguma maneira através do fogo.

16.Não sabeis que sois o Templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?

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Veja que quando um católico diz que a pedra é Cristo e ainda assim assume que também é Pedro, uma verdade não anula a outra, pois na eclesiologia Pedro é chamado a ser pedra de confirmação da fé e manutenção da unidade na Igreja quando os bispos entrassem em controvérsia. O próprio Pedro diz em sua epístola que cada cristão individual é uma pedra no edifício da Igreja. Então o fato de Paulo ensinar que os obreiros serão julgados por suas obras não anula a verdade universal de que cada cristão individualmente também será julgado por suas obras. E ele cita o fogo [não literal] como o meio pelo qual Deus prova a “obra de cada um”. Ora, o fato de que essa passagem se aplica aos padres não indica que somente padres/ministros serão julgados no Dia do Senhor, que virá como fogo. Pedro também fala que virá como fogo!

 

1 Pe 3: 10-12: “Entretanto, virá o dia do Senhor como ladrão. Naquele dia, os céus passarão com ruído, os elementos abrasados se dissolverão, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém. Vivam de maneira santa e piedosa, esperando o dia de Deus e apressando a sua vinda. Naquele dia os céus serão desfeitos pelo fogo, e os elementos se derreterão pelo calor”.

 

São Pedro também exortava os cristãos a serem perseverantes porque a fé de cada crente seria provada: “[…] para que a prova a que é submetida a vossa fé (mais precio­sa que o ouro perecível, o qual, entretanto, não deixamos de provar ao fogo) redunde para vosso louvor, para vossa honra e para vossa glória, quando Jesus Cristo se manifes­tar” (1 Pe 1: 7). Por isso que os santos padres aplicavam esse capítulo para falar do purgatório, pois a Escritura nos ensina que seremos provados durante a nossa vida e no teste final, que é o Julgamento do Dia do Senhor. NADA DEPÕE CONTRA A DOUTRINA. A única doutrina que essa interpretação poderia refutar é o sola fide. Mas tanto São Cipriano como Santo Ambrósio, São Jerônimo, São Gregório Magno, Orígenes e Santo Agostinho escreveram sobre essa passagem dizendo ser ela uma evidência do purgatório. E além disso, aplicá-la restringindo seu sentido a apenas obreiros é assumir uma posição difícil de defender e insustentável do ponto de vista lógico. Quer dizer que pelo fato de Paulo dizer que os obreiros vão ser julgados por suas obras isso implica dizer que somente se vc for missionário/obreiro Deus te julgará por suas obras? Que bobagem. Jesus disse que até por palavras ociosas seremos julgados no Dia (Mateus 12: 36-37) e Paulo confirmou que todos seremos julgados pelas obras que realizamos por meio do corpo, sejam boas ou más (2 Coríntios 5: 10). Aplicar isso a apenas uma classe de pessoas somente pelo fato de ele mencionar essa classe no verso para exemplificar o juízo de obras é ilógico. Como se a doutrina fosse aplicada apenas a certo tipo de pessoa e assim você assumisse que as únicas pessoas cujas obras serão julgadas por Deus no dia que vem como fogo ardente serão os padres e missionários. Vê por que nenhum padre restringiu o sentido a isso? Porque não tem lógica. Segue alguns:

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SÃO CIPRIANO DE CARTAGO
Uma coisa é defender o perdão, outra coisa é alcançar a glória; uma coisa é, quando lançado na prisão, não sair dali antes de pagar o último centavo; outra coisa é receber imediatamente o salário da fé e da coragem. Uma coisa é ser torturado por um longo sofrimento em razão dos pecados, ser limpo e purificado pelo fogo; outra é ter purificados todos os pecados pelo sofrimento. Em suma, uma coisa é ficar em suspense até a sentença de Deus no Dia do julgamento; outro é ser imediatamente coroado pelo Senhor.
Cartas 51[55]:20, ano 253 d.C.
ORÍGENES
SE UM HOMEM PARTE DESTA VIDA COM FALTAS MAIS LEVES, ELE ESTÁ CONDENADO AO FOGO QUE QUEIMA OS MATERIAIS MAIS LEVES E PREPARA A ALMA PARA O REINO DE DEUS, ONDE NADA IMPURO PODE ENTRAR. Pois se sobre o fundamento de Cristo você não construiu apenas ouro, prata e pedras preciosas; mas também madeira e feno e palha, o que você espera quando a alma for separada do corpo? Você entraria no céu com sua madeira e feno e palha e assim profanaria o reino de Deus… Resta então que você seja entregue ao fogo que queimará os materiais leves; pois nosso Deus… é chamado de fogo purificador. Mas esse fogo não consome a criatura, mas o que a própria criatura construiu, madeira, feno e palha. É manifesto que o fogo destrói a madeira de nossas transgressões e então nos devolve a recompensa de nossas grandes obras.
– Orígenes, Homilias sobre Jeremias, 185-232 d. C.
LACTÂNIO
Mas, quando julgar os justos, também OS PROVARÁ COM FOGO. Então aqueles cujos pecados excederem em peso ou em número serão queimados pelo fogo e incendiados. Mas AQUELES que foram imbuídos de plena justiça e maturidade de virtude não verão TAL FOGO; pois eles têm algo de Deus em si mesmos que repele e rejeita a violência da chama. Tão grande é a força da inocência que a chama se afasta dela sem causar dano; ela recebeu esse poder de Deus, de maneira que queima os ímpios e se encontra sob o comando dos justos.
– Lactânio, Institutas Divinas 7:21, ano 307 d.C.
SANTO AMBRÓSIO DE MILÃO
Quem é que batiza nesse fogo? Não é um presbítero, não é um bispo, não é João, que diz: “Eu vos batizo para a penitência” (Mt 3, 11); não é um anjo, não é um arcanjo, não são as dominações, não são as potestades, mas aquele sobre o qual João diz: “Quem vem após mim é mais forte que eu. Não sou digno de carregar as suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo. Ele tem a pá na sua mão e limpará a sua eira. Ajuntará o trigo no seu celeiro, mas queimará a palha com o fogo inextinguível” (Mt 3, 2,12). O Senhor não testifica o dito sobre esse batismo, que se dá pelos sacerdotes da Igreja (Mt 13, 49-50). Depois da consumação do século, certamente se dará esse batismo pelos anjos que serão enviados, que separarão os bons e os maus: quando a iniquidade será queimada pelo caminho do fogo, para os justos refulgirem no reino de Deus como o próprio sol no reino de seu Pai. E se alguém for santo como Pedro, como João, é batizado nesse fogo. Portanto, virá o grande Batista – assim o chamo, como Gabriel chamou dizendo: “Esse será grande” (Lc 1, 15) –, verá muitos em pé diante do vestíbulo do paraíso, moverá a espada versátil, dirá aos que estão à direita, que não têm pecados graves: Entrai, vós que ousais, que não temeis o fogo. Pois eu vos predissera: “Eis que venho como fogo” (Is 66,15); e dissera através de Ezequiel: “Eis que entrarei em Jerusalém e soprarei em vós, no fogo da minha ira, para que escorregueis do chumbo e do ferro” (Ez 22, 20).
Santo Ambrósio de Milão, In psalmum CXVIII expositio, Sermo III, 15 (PL 15, 1227 BCD), séc. IV d.C.
SANTO AGOSTINHO
“Que haja algum fogo após esta vida, não é algo incrível, e é possível averiguar e descobrir ou mesmo deixar em mistério se alguns dos fiéis serão salvos mais lentamente e outros mais rapidamente, em maior ou menor grau, conforme amaram as coisas boas que perecem, isso por meio de um certo fogo purgatorial”.
Manual de Fé, Esperança e Caridade 18:69, ano 421 d.C.
“O tempo que se interpõe entre a morte de um homem e a ressurreição final mantém as almas em recantos ocultos, conforme cada uma mereça repouso ou sofrimento, tendo em vista o que mereceu quando vivia na carne. Também não se pode negar que as almas dos mortos encontram alívio através da piedade de seus amigos e parentes que ainda estão vivos, quando o Sacrifício do Mediador [a Missa] é oferecido por eles, ou quando são dadas esmolas na Igreja. Mas essas coisas são proveitosas para aqueles que, quando estavam vivos, mereceram que depois pudessem ser ajudados por tais coisas. Há uma certa maneira de viver, nem tão boa de modo que não haja necessidade desses auxílios após a morte, nem tão perversa de modo que não sejam úteis eles após a morte”.
(ibid., 29:109).
É certo que o fogo mencionado é apenas uma figura, uma imagem de algo maior e superior a tudo que podemos conceber, usada pelo apóstolo por causa da similaridade com a situação que ele queria transmitir, para que possamos ter uma ideia do que ele queria dizer com “a obra de cada um aparecerá. O Dia (do julgamento) irá demonstrá-la. Será descoberta pelo fogo; o fogo provará” (1 Co 3,13). De fato, não sabemos como será o Juízo, mas sabemos que Deus nos provará de uma maneira que nunca experimentamos. Como diz o Papa Bento XVI sobre a abordagem do apóstolos acerca do uso do termo ‘fogo’: “São Paulo, na Primeira Carta aos Coríntios, dá-nos uma ideia da distinta repercussão do juízo de Deus sobre o homem, conforme as suas condições. Fá-lo com imagens que, de alguma forma, querem exprimir o invisível, mas sem as podermos transformar em conceitos, pelo simples motivo de que não nos é possível entrever o mundo além da morte nem possuímos qualquer experiência dele (Spe Salvi 46)
Foto de Gianna B na Unsplash
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Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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