NASCER DA ÁGUA E DO ESPÍRITO
Jesus, ao colocar estes termos “se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus” nos fala não do nascimento natural, como havia entendido Nicodemos e no qual todos nós fomos feitos alma vivente e o qual conhecemos. Jesus fala de nascer para uma vida nova, uma vida na qual é infusa em nós a natureza da divindade nos orientando às práticas próprias dela, isto é, às práticas de justiça, amor e santificação. É uma vida purificada do pecado pela lavagem do batismo, que abre a porta da graça para que essa virtude divina brote em nós: uma vida seguindo os propósitos de Deus. Deixar que o Espírito Santo nos guie, nos direcione e aja com liberdade em todos os âmbitos de nossa vida. Nascer de novo é nascer para Jesus através da água e do Espírito. Leia o que o Catecismo diz sobre essa atuação dupla na regeneração do homem: O elemento material que é a água (a qual somada à Palavra constitui o sacramento) + o efeito sobrenatural, que é o efeito vivificador do Espírito:
1227. Segundo o apóstolo São Paulo, pelo Batismo o crente comunga na morte de Cristo; é sepultado e ressuscita com Ele:
«Todos nós, que fomos batizados em Cristo Jesus, fomos batizados na sua morte. Fomos sepultados com Ele pelo batismo na morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos, pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova» (Rm 6, 3-4).
Os batizados «revestem-se de Cristo». Pelo Espírito Santo, o Batismo é um banho que purifica, santifica e justifica.
1228. O Batismo é, pois, um banho de água, no qual «a semente incorruptível» da Palavra de Deus produz o seu efeito vivificador. Santo Agostinho dirá do Batismo: «Accedit verbum ad elementum, et fit sacramentam – Junta-se a palavra ao elemento material e faz-se o sacramento»
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Jo 3: 6
TRANSFORMAÇÃO
É muito comum, então, a pergunta: “Mas se o banho regenerador é o Batismo, como alguns não vivem uma vida regenerada após o Batismo?!” A transformação é, portanto, uma das principais necessidades suscitadas em alegações de pessoas que desejam impor a consciência como forma de critério para o batismo. Todavia, consideremos alguns fatos:
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Não há comprovação de que uma pessoa tenha sido transformada/regenerada ao se sentir impactada por um sermão. Os sentimentos das pessoas são enganosos e volúveis. Se colocarmos tanto poder na consciência ao usá-la como critério para batizar então colocaremos limites à grande comissão bíblica de batizar o mundo. Se uma pessoa chora ao ouvir uma pregação, ela pode ter apenas se emocionado (e isso não significa conversão) e inclusive há quem caia em apostasia após alguma confissão pública de fé. Sua consciência não foi, portanto, decisiva nesse assunto;
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A Igreja não pode impedir o batismo de crianças ou pessoas com deficiência mental, por exemplo, só pelo fato de elas serem destituídas de consciência (no primeiro caso, temporariamente, no segundo, permanentemente). Se o critério é este, o qual automaticamente fecharia a porta para inúmeras pessoas que jamais poderão fazer uma escolha consciente, então confessamos que a ação divina fica restrita à capacidade humana. E isso seria tal ato uma flagrante desobediência ao mandado “Ide por todo o mundo batizando…”. A consciência não é, portanto, decisiva também nesse assunto ou sine qua non (como alguns sugerem).
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Crer que o Batismo produz a graçaex opere operatonão constitui uma desvalorização do sacramento. Há quem diga que se a Igreja ministra o Batismo a uma criança ou um deficiente mental, ela está jogando pérolas aos porcos. Porque é requerida a consciência da alma do indivíduo, que deve entender o evangelho e ainda aquilo que está ocorrendo ali. Pensar dessa forma é que de fato desmerece e desvaloriza o dom de Deus, pois é limitá-lo às potências humanas. A Igreja Católica ensina que o poder do sacramento está na promessa de Deus quando Ele os confiou ao seu povo, e não na vontade, deliberação, moralidade ou capacidade humana. A graça é então livre, e aberta ao batizado, mas os resultados das atuações do Espírito que provêm dessa graça carece da recepção da alma aos seus estímulos, isto é, que o batizado seja aberto e dócil à graça que lhe é disponibilizada.
Disso decorre um monte de concepções e implicações e uma das grandes diferenças entre os católicos e alguns segmentos protestantes. Para o primeiro, por exemplo, “nascer de novo” significa ser transformado pela graça de Deus que flui do batismo e continua no decorrer de toda a vida, sendo uma participação na vida divina por meio da disciplina santificante do Espírito.
Para o segundo, “nascer de novo” é ir a algum evento, igreja ou palestra gospel em que há algum avivamento, ouvir uma pregação na qual o líder diz algo do tipo: “Se você crer no Senhor Jesus Cristo, confessar que Ele morreu pelos seus pecados, você será salvo!”. Ou “Venha à frente para eu orar por você e assim você recebrá o Novo Nascimento”. De fato, não se nega que uma experiência emocional pode sim ser instrumento para que a mensagem do evangelho nos toque e nos faça ponderar sobre nossas vidas e corrigi-las. Todavia, os católicos chamam isso de correção, disciplina, chamado à penitência após algum pecado, etc. Ou seja, serve para que alguém busque fazer penitência, reparar seus pecados, mudar a rota caso tenha sido disperso (metanoia – arrependimento), mas essa não é a verdadeira regeneração (“nascer de novo”) segundo a Bíblia. Muitas dessas pessoas, inclusive, já eram cristãs batizadas, mas a sua experiência no evento é tão marcante que elas começam a acreditar que o batismo realizado antes do sermão ou cruzada ou evento gospel ter acontecido e mudado suas vidas deve ser feito de novo. Há, até mesmo, pessoas que fazem peregrinações a lugares considerados especiais e santos, como o rio Jordão em Israel, para que elas possam ser batizadas novamente! Isso é problemático porque a Escritura nos ensina que Deus nos repreende diversas vezes em nossa existência, e , no entanto, há somente um batismo. Se alguém for corrigido e se arrepender de pecados sentindo-se renovado por causa de algum sermão 10 vezes durante a vida, há igrejas que estão dispostas a realizar inúmeros batismos para uma mesma pessoa. Ora, como foi dito, só existe um único batismo. Neste, houve uma transformação da morte para a vida, mesmo que a pessoa não tenha sentido nenhum frio na barriga ou arrepio. Por quê? Porque Deus prometeu. O sacramento é exatamente isso, algo que Deus faz por nós, nos limpando por meio da água e do Espírito ao som das palavras do sacerdote. E o batismo é a abertura à graça que flui da obra de Cristo na cruz, a qual nos inspira e nos molda diariamente. Essa é a verdadeira conversão, um voltar-se para Deus continuamente, sendo dócil à sua atuação divina em nossas almas.
O BATISMO NOS LAVA DOS PECADOS
O Batismo de fato nos lava dos nossos pecados e nos dá uma nova natureza, pois esta é precisamente o que os teólogos dizem da graça, que é germe de glória e participação na natureza divina. É quebrar o poder do pecado sobre Adão através da habitação do Espírito em nós. Pedro confirmou isso, quando declarou: serão “batizados, cada um de vocês em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo” (Atos 2:38). Paulo também declarou que o processo de conversão da natureza do homem ocorre no batismo: “Não sabeis que todos nós que fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, portanto, sepultados com ele na morte pelo batismo, para que, assim como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, também nós possamos andar em novidade de vida” (Romanos 6:3-4. Cf. Colossenses 2:11-13). Por isso a Igreja primitiva entendeu que o nascer da água e do Espírito em João se referia à regeneração batismal, que não era um simples símbolo. Isso era reconhecido como um ensino claro e bíblico entre os primeiros cristãos e por isso não viam problema, por exemplo, com o batismo de crianças, já que acreditavam que o sinal sacramental de fato opera uma limpeza real nos pecados, nos pessoais no caso de adulto e no pecado original no caso das crianças. Santo Agostinho fala disso claramente:
Cap. 43 – O Batismo e a Graça a qual ele tipifica são acessíveis a todos, crianças e adultos.
Pois qualquer que seja a pessoa, o recém-nascido ou o velho decrépito, como ninguém é proibido de tomar parte no batismo, assim também não há ninguém que não morra para o pecado após o batismo. Ainda assim, contudo, as crianças morrem apenas para o pecado original; enquanto que os mais velhos morrem também para todos os demais pecados, os quais foram acrescentados pelo seu mau procedimento em vida àquele pecado que trouxeram consigo ao nascerem.
Manual da Doutrina Cristã (Enchiridion), 43, Santo Agostinho, ano 421 d.C.
Irineu, o bispo de Lyon, escreveu sobre o Batismo:
“E [Naamã] mergulhou. . . sete vezes no Jordão’ [2 Reis 5:14]. Não foi à toa que o antigo Naamã, quando sofria de lepra, foi purificado ao ser batizado, mas [isso serviu] como uma indicação para nós. “Pois, como somos leprosos no pecado, somos purificados, por meio da água sagrada e da invocação do Senhor, de nossas antigas transgressões, sendo regenerados espiritualmente como bebês recém-nascidos”.
São Pedro, inspirado pelo Espírito Santo, disse que, como na época do dilúvio, em que oito pessoas foram “salvas pela água”, assim também com relação aos cristãos hoje, “o batismo os salva”:
²⁰ […] quando Deus aguardava com paciência, enquanto se edificava a arca, na qual poucas pessoas, isto é, apenas oito se salvaram por meio da água.*
21 Essa água prefigurava o batismo de agora, que vos salva também a vós, não pela purificação das impurezas do corpo, mas pela que consiste em pedir a Deus uma consciência boa, pela Ressurreição de Jesus Cristo.*
1 Pedro 3:20,21
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