Orígenes é um bom trunfo contra a Invocação dos Santos?

Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro

INTRODUÇÃO

 

Um dos mais recorrentes nomes utilizados por protestantes para negar a intercessão ou invocação dos santos nos Pais da Igreja é Orígenes (184 – 253 d. C.).  É algo acordado entre os protestantes e os católicos que os anjos levam as súplicas dos homens a Deus. Negar isso seria o equivalente a negar as Escrituras (Tobias 12: 12, Apocalipse 8: 4, Mateus 18: 10). Outra concordância entre nós diz respeito ao estado intermediário  [não absolutamente] e às promessas de Cristo de que os homens serão semelhantes aos anjos do céu. Com exceção do primeiro caso, que é uma doutrina negada por alguns grupos que ensinam o sono da alma, até aqui estamos OK. Também a Bíblia nos encoraja a orarmos por pessoas e suplicarmos como advogados diante de Deus em seu favor (Apocalipse 6: 9-10, Tiago 5:16, Mateus 5: 44), nos tornando seus intercessores pessoais aqui na terra. Nisso também concordamos. O momento de desavença entre católicos e protestantes ocorre no passo seguinte que os católicos geralmente dão ao juntar todas essas verdades reveladas e chegar à conclusão óbvia e direta de tais doutrinas.

 

DEUS É O DESTINATÁRIO FINAL DAS ORAÇÕES

 

Tentar usar Orígenes para defender o sono da alma é impossível, dado o grande número de registros de seus escritos sustentando a consciência dos mortos no estado intermediário. Isso, no entanto, não impedirá alguns defensores da doutrina de citá-lo como bastião da verdadeira ortodoxia contra os católicos. Além deles, outros grupos farão o mesmo, inclusive os que negam o sono da alma. Orígenes é como uma mão na roda para aqueles que desejam atacar os que creem na invocação dos santos. Mas isso é um erro. É importante destacar que embora a Igreja mantenha escritos de Orígenes, sendo considerado um ilustre erudito de seu tempo e elogiado por nomes como Eusébio de Cesareia e outros, seus escritos não são e nem devem ser considerados como uma regra de ortodoxia para os fiéis, uma vez que contêm erros publicamente condenados pela Igreja (Leia sobre o Origenismo). Seu valor como testemunha se enquadra mais no âmbito da historiografia. Orígenes defendia claramente a intercessão dos santos e anjos no céu em favor dos que estão na terra, mas uma crítica contida em sua obra apologética Contra Celsum é repetidamente aludida em razão da invocação. Seriam os mortais permitidos a fazer pedidos aos que estão no céu? É importante notar o teor das palavras de Orígenes, que buscava trazer um esclarecimento quanto ao destinatário final das orações dos cristãos: Deus é quem fornece todos os bens: “Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação (Tiago 1:17). Ele diz:

 

[…] pois nosso dever é orar somente ao Deus Altíssimo, e ao Unigênito, o Primogênito de toda a criação, e pedir a Ele como nosso Sumo Sacerdote para apresentar as orações que sobem a Ele de nós, ao Seu Deus e nosso Deus, ao Seu Pai e Pai daqueles que dirigem suas vidas segundo a Sua palavra.

– Contra Celso livro 8, capítulo 26

 

Agora, é preciso considerar com muita cautela o que Orígenes queria dizer nesse trecho. Veja que em momento algum jamais negou a agência tanto das criaturas orantes agelicais quanto humanas como intercessores. O trecho completo trata de uma oposição à doutrina de Celso, seu adversário que dá nome ao seu tratado, de fazer orações a demônios, além de sacrifícios de propiciação.

 

E não devemos dar crédito aos demônios, embora Celso nos exorte a fazê-lo; mas se quisermos obedecer a Deus, devemos morrer, ou suportar qualquer coisa, antes de obedecer aos demônios. Da mesma forma, não devemos fazer oferta de propiciação a demônios; pois é impossível propiciar (oferecer o sacrifício) a seres que são maus e que procuram prejudicar os homens. Além disso, segundo quais leis Celso deseja que sacrifiquemos aos demônios? Pois se ele se refere às leis promulgadas nos estados, deve mostrar que estão de acordo com as leis divinas. Mas se isso não puder ser feito, visto que as leis de muitos estados são bastante inconsistentes umas com as outras, essas leis, portanto, devem necessariamente não ser leis no sentido próprio da palavra, ou então devem ser promulgações de homens ímpios; e a estes não devemos obedecer, pois devemos obedecer a Deus e não aos homens. Afaste-se, então, deste conselho que Celso nos dá, de oferecer oração aos demônios: não deve ser ouvido nem por um momento; pois nosso dever é orar somente ao Deus Altíssimo e ao Unigênito, o Primogênito de toda a criação, e pedir a Ele, como nosso Sumo Sacerdote, que apresente as orações que ascendem a Ele de nós, a Seu Deus e nosso Deus, ao Seu Pai e ao Pai daqueles que dirigem suas vidas de acordo com Sua palavra. 

Ibid, capítulo 26

 

Orígenes também em seus escritos sempre buscou deixar claro que tipo de intenção deve haver na comunicação entre os filhos de Deus, isto é, a natureza das intenções humanas ao reunirem o desejo de peticionar junto a intercessores: eles jamais devem confundir os intercessores com a fonte de onde provêm os dons que os suplicantes almejam, a qual é Deus. Mas será que qualquer petição de intercessão é vedada na teologia de Orígenes? Leia o seguinte tópico.

 

PODEMOS OFERECER PEDIDOS DE INTERCESSÃO A HOMENS E ANJOS?

 

Alguns usam o argumento de que Orígenes queria restringir a noção de intercessão apenas a pessoas vivas quando tratou do tema. Todavia, ao lidar com a súplica por intercessão, fica evidente na obra Sobre a Oração -, ao falar das almas dos santos e anjos intercedendo -,  que Orígenes não limitava a intercessão apenas a pessoas que vivem na terra e que se encontram ainda no corpo. Ele então considera que todo homem pode interceder mesmo morto. 

 

Mas não somente o Sumo Sacerdote (Cristo) ora por aqueles que pedem com sinceridade, mas também os anjos […] como também as almas dos santos que já dormem.

– Sobre a Oração, 11, ano 233 d.C

 

Deve-se ter em mente que – segundo Orígenes -,  nenhum ser orante fornece bem algum àquele por quem pede, mas tão somente sua própria intercessão. Deus é o juiz que dispensa ou não o dom, deferindo ou indeferindo a petição, não os santos ou anjos, embora intercedam. Veja que ao tratar da oração na mesma obra, ele declara firmemente não ser proibido a petição por intercessão aos homens. Considere:

 

Agora, quanto ao pedido de intercessão e ação de graças, não é algo inadequado de se oferecer até mesmo aos homens – os dois últimos, intercessão e ação de graças, não apenas aos homens santos, mas também a outros. Todavia, peça apenas aos santos, caso algum Paulo ou Pedro apareça, para nos beneficiar, tornando-nos dignos de obter a autoridade que lhes foi conferida para perdoar pecados. Acrescento que, na verdade, mesmo que um homem não seja um santo e nós o ofendemos, podemos nos tornar conscientes de nosso próprio pecado contra ele de modo a lhe dirigirmos um pedido, isso com o intuito de recebermos dele até mesmo o perdão pela nossa ofensa. No entanto, se oferecemos ações de graças a homens que são santos, quanto maior é o nosso dever de dar graças a Cristo, que sob a vontade do Pai nos conferiu tantos benefícios? Sim, e intercede junto a Ele tal como fez Estêvão, quando disse: “Senhor, não lhes imputes este pecado”. Imitando o pai do lunático, nós diremos: “Peço, Senhor, tenha misericórdia” de meu filho, ou de mim mesmo, ou seja qual for o caso. 

– Sobre a Oração 10, ano 233 d.C

 

Muitos podem alegar que pelo fato de o autor citar o perdão de pecados conferido a alguém por parte de um homem comum (não na categoria de um santo), ele está tratando de vivos: os dois últimos, intercessão e ação de graças, não apenas aos homens santos, mas também a outros. O exemplo anterior a este, o qual foi citado acima, revela que Orígenes não via nenhum problema em santos mortos intercedendo. Há santos vivos e santos mortos, e ambos podem interceder: Não há qualquer indicação no texto de que ele colocou limites à categoria capaz de interceder. Traçar tal restrição é ir além do texto e daquilo que Orígenes escreveu. Ele TAMBÉM começa dizendo que tanto o pedido de intercessão quanto a ação de graças são permitidas a homens, citando em seguida a preferência quanto aos chamados homens santos, tal como os apóstolos e a seus sucessores que estão incumbidos do sacerdócio, isto é, receberam de Cristo o poder para perdoar os pecados dos homens no sacramento da confissão. Ele então argumenta que essa concessão dada aos homens santos pode ser estendida a homens comuns quando ofendidos pessoalmente por alguém, tendo eles o poder de conceder o perdão de pecados ao seu ofensor. Orígenes faz em seguida alusão ao dever de todo cristão de interceder, tal como Estêvão e o pai do lunático, comparando-os com Cristo mas exaltando o Senhor Jesus pelo seu ofício primordial (Cristo é o intercessor por natureza, mas os demais o são por participação): “Sim, e [Jesus] intercede junto a Ele [o Pai] tal como fez Estêvão […] se oferecemos ações de graças a homens que são santos, quanto maior é o nosso dever de dar graças a Cristo…”. 

 

NUM SENTIDO ESTRITO, APENAS O PAI RECEBERIA ORAÇÃO

 

Ele está claramente dizendo que homens são intercessores também, junto de Cristo, que é o Cabeça, sendo superior ao seu Corpo (a Igreja), mas ainda assim dando a eles capacidade para participar de seu ministério (tal como fez com o perdão de pecados). Isso torna ainda mais claro que Orígenes entendia que não é o fato de alguém ser Deus ou uma divindade que o torna capaz para interceder. Os homens e os anjos também intercedem. O fluxo argumentativo também confirma essa interpretação pelo fato de anteriormente ele ter citado o perdão de pecados como uma delegação dada formalmente e oficialmente aos apóstolos, mas que também se estende àqueles que possuem o poder de perdoar pecados pessoais dirigidos a eles, mesmo não sendo “santos” (aos quais Orígenes recomenda que os homens devem dar prioridade: Todavia, peça apenas aos santos…). Mesmo estes não tendo recebido a autoridade de Pedro e Paulo, podem exercer esse ofício em situação específica. Em seguida, ele acrescenta o tema da intercessão, mencionando além desses, Estevão e o pai do lunático. O motivo de ele não negar tal capacidade a homens após a morte fica ainda mais claro quando ele vai adiante em sua definição de intercessão e traça uma diferenciação entre intercessão em sentido estrito e intercessão em sentido amplo, demonstrando que ele tinha em mente o segundo quando falava. Daí ele acrescenta que se o provedor de todas as coisas é o Pai, então se alguém seguir o sentido mais estrito da oração, tal pessoa nem ao menos poderia dirigir a Jesus Cristo qualquer petição, pois o Pai é que é a fonte de todo bem:

 

Mas se aceitarmos a oração em seu pleno significado, nunca poderemos orar a qualquer ser gerado, nem mesmo ao próprio Cristo, mas apenas ao Deus e Pai de Todos, a quem nosso Salvador orou, como já exemplificamos, e nos ensina a orar. Pois quando Ele ouviu alguém dizer: “Ensina-nos a orar”, Ele não instruiu os homens a orar para Ele mesmo, mas ao Pai dizendo: “Pai nosso que está nos céus”, e assim por diante.

 Ibid 10, ano 233 d.C

 

Veja, no entanto, que Orígenes jamais excluiu da ortodoxia a oração feita diretamente a Cristo, o que prova que ele não seguia esse modelo de interpretação estrita, tampouco a impusera a alguém. Por que ele não achava que orar a Cristo era pecado? Porque para ele fazer pedido de intercessão não diz respeito a considerar o peticionado O FORNECEDOR FINAL do dom requerido na oração. Por isso ele considerou apropriado fazer pedidos de intercessão a anjos e homens, os quais podem ser solicitados pelo fato de essa interpretação estrita não ser aquela que seguimos nessas situações. Isso explica bem o trecho controverso dele: quando ele se refere a não requerer de seres orantes a provisão (Contra Celsum, V, 4-5), ele tratava de uma questão mais específica, isto é, de um pedido de caráter não intercessório meramente, mas considerando aquele ser o destinatário final da oração. Nenhum ser é provedor senão o Pai (em um sentido mais estrito, pelo menos). Se Orígenes estava certo ou não quanto a essa questão, isso não importa (Refiro-me ao tratamento quanto ao Filho). O que importa é entender que ele não compreendia ser uma impossibilidade o ato de peticionar a seres criados (e no caso do Filho Eterno, o gerado), desde que se tivesse em mente que o destinatário e o fornecedor de bens é o Pai. Todos recebem, em última instância, do Pai todas as coisas, mas todos podem pedir e interceder uns pelos outros por causa da comunhão.

 

ORÍGENES

Wikimedia Commons: Public Domain

A COMUNHÃO DOS SANTOS

 

Orígenes também acreditava que o motivo de haver intercessão mesmo após a morte se devia, é evidente, ao vínculo de amor entre todos os santos, o qual não poderia ser rompido com a morte:

 

[….] Todos os santos que deixaram esta vida, tendo assim caridade pelos que continuam neste mundo, cuidam da salvação deles, e os auxiliam com suas preces e intercessão junto a Deus. De fato, nos Livros dos Macabeus está escrito: “Este é Jeremias, o profeta de Deus, que reza sem cessar pelo povo” (2Mc 15,14).

Comentário ao Cântico dos Cânticos, Livro III, 7, 30

 

Orígenes também afirmava que os santos no céu possuem uma situação superior aos santos na terra, o que lhes permitia interceder com mais eficácia, já que seu amor estava já livre de pecados e dos vícios que lhes prendiam enquanto se encontravam outrora na carne. Além disso, aponta novamente o vínculo do amor que transpõe a morte (comunhão dos santos), citando como base para sustentar seu argumento os livros de Macabeus e Tobias.

 

Mas estes oram junto àqueles que oram de forma genuína – não apenas o Sumo sacerdote, mas também os anjos que “se alegram no céu por um pecador arrependido mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”, bem como também as almas dos santos que já estão em descanso. Dois exemplos deixam isso claro. O primeira ocorre quando Rafael oferece seu serviço a Deus em favor de Tobias e Sara. Depois que ambos oraram, a escritura diz: “A oração de ambos foi ouvida diante da presença do grande Rafael e ele foi enviado para curar os dois” (Tb 3: 16-17), e o próprio Rafael, ao explicar sua comissão angélica sob a ordem de Deus para ajudá-los, afirma:”Mesmo agora, quando você orou junto de Sara, sua nora, eu trouxe a memória de sua oração diante do Santo [Deus]”, e pouco depois: “Eu sou Rafael, um dos Sete anjos que apresentam as orações dos santos e comparecem diante da glória do Santo. Assim, pelo menos de acordo com o relato de Rafael, a oração com jejum, esmola e justiça é uma coisa boa. O segundo exemplo está nos Livros dos Macabeus, no qual Jeremias aparece em abundante  “glória e de cabelos brancos”, de modo que uma autoridade maravilhosa e majestosa estava sobre ele, e ele estende a mão direita e entrega a Judas uma espada de ouro, testemunhando ali outro santo já em repouso [morto], dizendo: “Este é aquele que muito ora pelo povo e pela cidade sagrada, o profeta de Deus, Jeremias” (v. 14). Pois é absurdo quando o conhecimento, embora manifesto aos dignos através de um espelho e de um enigma ao presente, sendo revelado face a face, não consideramos que o mesmo é verdade também para todas as outras excelências, de modo que aqueles que se preparam nesta vida anterior tornam-se estritamente perfeitos depois dela. Ora, uma dessas excelências no sentido mais estrito, de acordo com a palavra divina, é o amor ao próximo, e sendo assim, isto [o amor], nós somos compelidos a pensar,  os santos  que se encontram já em repouso possuem em um grau muito mais elevado, mais do que aqueles que se encontram em fraqueza humana e lutam junto dos mais fracos. Não é somente aqui [na vida presente] que isso ocorre: “se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele e se um membro é glorificado, todos os membros se alegram com ele” na experiência daqueles que amam seus irmãos, pois isso convém ao amor também daqueles que estão além da vida presente de modo a dizer: “Tenho ansiedade por todas as igrejas : Quem é fraco, que eu também não enfraqueça? Quem é levado a tropeçar de modo que eu não seja consumido?” (2 Co 11: 28-29). Especialmente quando Cristo confessa que, em concordância com isso, se um dos santos for fraco, Ele fica fraco da mesma maneira, e estando na prisão e nu, ou sendo um estrangeiro, faminto e sedento. Pois por acaso quem lê o evangelho ignora que Cristo, ao assumir sobre si tudo o que acontece aos crentes, considera seus sofrimentos como sendo seus próprios?

– Sobre a Oração 6, ano 233 d.C

 

Em dois artigos, aqui e aqui, o apologista americano Dave Armstrong demonstrou como o fato de em Contra Celsum, no Livro VIII, 64, Orígenes ter feito uso da concessão com respeito aos que invocam (solicitam/pedem) e aos que não invocam, demonstrava claramente que ele não condenava a prática do pedido, como disse acima: Agora, quanto ao pedido de intercessão e ação de graças, não é algo inadequado de se oferecer até mesmo aos homens. Dave Armstrong observa o seguinte: “O uso da palavra “mesmo” demonstra que Orígenes assume que também é o caso de eles orarem por nós quando são solicitados; isto é, invocados”. Ambos são possíveis.

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“Estes [santos e anjos que partiram], mesmo quando não solicitados, oram com eles [com os cristãos]…”

 

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Lendo o contexto, vemos que Orígenes em nenhum momento expressa repulsa à prática. Fica ainda mais claro que ele não condenava pedidos diretos a seres criados e ao Filho gerado sob a alegação de não serem eles a fonte primordial dos dons quando o próprio Orígenes aparece citando aquelas que seriam suas palavras direcionadas a um anjo cuja missão é tratar de um convertido: Venha Anjo… receba-o, cuide dele e instrua-o… acolhe-o, conceda-lhe o batismo… convoque para ti outros companheiros de seu ministério”. Pedir boas coisas em favor de alguém não é algo maligno, sobretudo quando se tem em mente a ação que os anjos operam em nosso meio. Oração vem do latim  oratio, de oris (boca), pois trata-se de uma fala, uma comunicação entre a criatura e Deus ou umas com as outras, por isso a palavra orador diz respeito àquele que profere um discurso. Uma oração pode se tornar idolátrica? Sim, mas não é a própria oração que possui essa natureza por si só. E como Orígenes deixou muito claro, sendo a agência dos seres celestais em nosso meio meramente intercessória, tudo que podemos pedir-lhes é que levem nossas petições a Deus apresentando-lhe seus méritos em defesa de nossa causa. Isso nos será muito benéfico e não incorreremos em idolatria à medida que tivermos isso em mente, isto é, que Deus é o destinatário e o provedor final de nossas preces.

 

Ontem você estava sujeito a um demônio; hoje você está sob [a guarda de] um anjo. O Senhor diz: “Não desprezeis a nenhum destes pequeninos” que estão na Igreja; “Em verdade vos digo que os seus anjos sempre veem a face de meu Pai que está nos céus” [Mt 18,10]. Os anjos se dedicam à tua salvação; eles prometeram doar a si mesmos para o serviço do Filho de Deus, e dizem uns aos outros: “Se Ele desceu, e desceu em um corpo, se Ele foi vestido com a carne mortal e suportou a cruz, e morreu pela humanidade, por que descansamos? Por que nos poupamos? Venham, desçamos todos, todos os anjos do céu!” […] Tudo está repleto de anjos: “Venha Anjo [veni, angele]! Toma um velho que se converteu de seu erro pregresso, das doutrinas de demônios [1Tm 4,1], de pronunciar a iniquidade com altivez [S1 73,8]. Receba-o, cuide dele e instrua-o como um bom médico. Ele é uma criança: hoje nasce um homem velho, um idoso volta a ser um menino. E após você tê-lo acolhido, conceda-lhe o batismo do segundo nascimento e convoque para ti outros companheiros de seu ministério, para que igualmente possam instruir na fé todos os que outrora foram enganados.

Homilia sobre Ezequiel, cap. 1,1, ano 238 d.C.

 

CONCLUSÃO

 

Todos esses dados nos levam a perceber quão complexo pode ser o pensamento de uma pessoa. Orígenes, novamente destacando, não deve ser considerado como uma autoridade final para definir de forma categórica qual posicionamento a Igreja deve seguir. Sua doutrina, por outro lado, mesmo assim não fornece aos opositores da intercessão/invocação dos santos um fundamento sólido. Que esse artigo tenha ajudado aqueles que são vacilantes e forneça vigor aos que já têm a fé confirmada, de modo que se confirme mais ainda. E acima de tudo, que Deus abençoe a todos.

 

Foto de Iam Os via Unsplash

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Kertelen Ribeiro

Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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Kertelen Ribeiro é uma ex-protestante convertida ao catolicismo romano. Sendo leiga, faz parte da Legião de Maria. Ama ícones, arte e se arrisca no desenho, mas ainda não sabe fazer sombra direito. Graduada em Letras – Português e pós-graduada em Tradução do Inglês pela Estácio, atua como tradutora freelancer e deseja servir a Cristo, se esforçando para fazer a Sua vontade. Livros sempre foram o caminho.

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