Há um fenômeno que eu chamo de “mirar em Maria e acertar em Jesus”. Refere-se a toda uma classe de argumentos protestantes anti-Marianos que, se verdadeiros, também negariam a Divindade ou a impecabilidade de Cristo. Uma boa pergunta a se fazer é: “este argumento contra Maria também seria um argumento contra Jesus?” Acontece que alguns dos argumentos mais populares contra Maria falham neste teste.
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Exemplo 1: “Todos pecaram”
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Romanos 3:23-24 diz que “uma vez que todos pecaram e carecem da glória de Deus, são justificados gratuitamente pela sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus”. No contexto, Paulo está se referindo à necessidade tanto dos judeus quanto dos gentios de justificação pela fé. Mas tirando suas palavras do contexto e aplicando-as a cada ser humano individual, esta é uma “evidência” de que Maria deve ter pecado. Afinal, “todos” significa “todos”, não? Vamos levar esse argumento a sério. Cristo também é totalmente humano, então esta é uma “evicência” tão boa de que Ele deve ter pecado, careceu da glória de Deus e teve de ser redimido… por Ele mesmo. Afinal, “todos” significa “todos”. Isso é baboseira herética, é claro. Miramos em Maria, mas acertamos Jesus.
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Exemplo 2: “Ninguém é Maior do que João Batista”
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Outro exemplo é Mateus 11:11. Assim como Romanos 3:23, trata-se de uma única linha da Escritura sem contexto. Desta vez, são as palavras de Jesus que diz “entre os nascidos de mulher ninguém foi maior do que João Batista”. Isso é tratado como uma arma fumegante em forma de verso. João Batista é um pecador – não há debate sobre esse ponto – e se Maria nasceu de mulher, ela não pode ser maior que João Batista e, portanto, deve ser uma pecadora. Mais uma vez, leve o argumento a sério. Se Jesus está literalmente dizendo que nenhum nascido de mulher é maior que João Batista, isso significaria que o próprio Jesus não é maior que João Batista. Isso, por sua vez, significaria que Jesus deve ser um pecador, tanto quanto provaria que Maria deve ser. Afinal, Cristo é um dos “nascidos de mulher” (ou mais precisamente, nascido de mulher), como diz Gálatas 4:4-5: “Mas, cumprindo-se o tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher. , nascido sob a lei, para resgatar os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos”. Claro, isso é mais baboseira herética, e João Batista será o primeiro a dizer isso: “Este é aquele de quem eu disse: ‘O que vem depois de mim passou adiante de mim, porque existia antes de mim’” (João 1: 15); “Eu batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis, aquele que vem depois de mim, de cujas sandálias não sou digno de desamarrar” (João 1:26-27); “É necessário que ele cresça, mas que eu diminua” (João 3:30), etc.
E Jesus também diz isso em João 5:33-36. Então, mais uma vez, o que começa como um argumento anti-Mariano termina sendo uma negação da cristologia ortodoxa. Mire em Maria, acerte em Jesus.
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Exemplo 3: Mãe de Deus? ou portador de Cristo?
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Esses argumentos de “mirar em Maria, acertando em Jesus” não são novidade. Na verdade, eles datam de mais de mil e quinhentos anos. O herege do século V, Nestório, recusou-se a chamar Maria de “Mãe de Deus” (Theotokos, “Mãe de Deus”), referindo-se a ela como “Mãe de Cristo” (Christokos, “Mãe de Cristo”). Seu argumento era de que Maria constituía a origem da sagrada Humanidade de Cristo, mas não de Sua Divindade, e que Mãe de Deus pareceria elevá-la ao status Divino.
Este argumento vai contra a evidência bíblica. Isabel refere-se a Maria como “a mãe do meu Senhor” (Lucas 1:43), usando um título divino para o Filho de Maria (Senhor). Mas esta distinção entre Mãe de Cristo e Mãe de Deus também promove uma cristologia ruim. Afinal, se Maria é a Mãe de Cristo, mas não a Mãe de Deus, então Cristo não é Deus. Assim, o que aparece como um argumento contra Maria resulta da verdade e do fato de que existe uma Pessoa que habitou no ventre de Maria, e esta pessoa é o Deus-Homem Jesus Cristo. A Igreja respondeu a isso realizando um Concílio Ecumênico em Éfeso, exatamente onde Maria passou seus últimos dias com o Apóstolo João. Ali, no Primeiro Concílio de Éfeso em 431, as heresias de Nestório foram definitivamente condenadas. A Igreja primitiva viu o que muitos de nós esquecemos hoje: que essas disputas acerca de Maria não são realmente sobre Maria, mas sobre Cristo.
Três Pontos Estratégicos
Por que isso continua acontecendo? Por que esses argumentos contra Maria tão frequentemente se tornam argumentos contra Cristo? Eu sugeriria três pontos: um exegético e dois teológicos.
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- Exegeticamente, precisamos ler as Escrituras no contexto. Muita apologética protestante é construída sobre textos de prova: tomam uma frase ou sentença parcial (tal como “todos pecaram”, “ninguém maior do que João Batista”, “um só Mediador entre Deus e o homem”, “a ninguém chameis de Pai”, “as ovelhas ouvem a minha voz”, etc.), e despojam-na de seu contexto bíblico. Fique atento às instâncias nas quais um único versículo é aplicado a um assunto que a passagem nem mesmo aborda, porque isso é um bom sinal de que a passagem está sendo utilizada de maneira abusiva. No caso de Romanos 3:28, o contexto teria nos dito que Paulo falava sobre como judeus e gentios responderam à revelação dada a cada um, e de nossa necessidade comum de justificação pela fé. Paulo não estava tentando enfatizar a pecaminosidade ou impecabilidade de Maria (ou de Jesus). Em Mateus 11:11, a citação é retirada da segunda metade do versículo. O que Cristo realmente diz é que “entre os nascidos de mulher não surgiu ninguém maior do que João Batista; mas aquele que é o menor no reino dos céus é maior do que ele. De novo, vemos que Cristo está dizendo algo diferente do que os protestantes estão tentando fazê-lo dizer. No contexto, Ele está falando sobre a Antiga e a Nova Aliança, não sobre a inferioridade de Maria em relação a João. Também significa que devemos ler as Escrituras em seu contexto cultural. Por exemplo, em Mateus 11:11, Jesus está usando uma hipérbole semítica clássica ao falar sobre João Batista. Essas expressões hiperbólicas são frequentemente usadas em hebraico, mas os literalistas modernos tendem a pensar que tais figuras de linguagem (incluindo exageros) são equivalentes a mentir. Precisamos aprender a abordar as Escrituras nos termos das Escrituras e deixar que o texto inspirado fale por si.
2. A vida de Maria é um referencial. 100% da razão pela qual nós católicos nos preocupamos com Maria é porque nos preocupamos com Jesus. Os protestantes tendem a ser céticos em relação a essa afirmação, mas esses ataques a Maria confirmam isso. Ao puxar os fios marianos, você começa a desfiar todo o suéter cristão.
3. Satanás odeia Maria. A maldição sobre a serpente diz que foi colocada uma “inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente” (Gênesis 3:15). A “mulher” em guerra com Satanás é Maria, a mulher a quem Jesus Cristo e São Paulo se referem exclusivamente como “Mulher” (João 2:4; 19:26; Gálatas 4:4). E em Apocalipse 12, vemos a Mãe de Deus entronizada no Céu (Apocalipse 12:1-3), milagrosamente protegida das ciladas do diabo. O capítulo conclui dizendo que “o dragão irou-se contra a mulher e foi guerrear contra o resto da sua descendência, contra os que guardam os mandamentos de Deus e dão testemunho de Jesus” (Ap 12:17).
Então, positiva ou negativamente, Maria é importante por causa de sua importância para Cristo. Os católicos amam Maria, e isso ocorre porque nós amamos Jesus, e Satanás odeia Maria porque odeia Jesus. Por extensão, ele odeia todos os cristãos fiéis pelo mesmo motivo: somos retratados nas Escrituras como seus filhos (Ap 12:17; Jo 19:27). Não é surpresa, então, que ele procure nos separar de nossa Mãe, ou separar Maria de seu Divino Filho.
Essa é a razão mais profunda, espiritualmente falando, pela qual os ataques a Maria acabam atingindo Jesus.
Tradução de Kertelen Ribeiro do texto Aim at Mary, Hit Jesus




