A idolatria é um ato consciente por natureza ou definição. Os católicos são acusados de substituir o Deus vivo pelo pão e pelo vinho como ídolos. Acho que praticamente nenhum católico que saiba alguma coisa sobre a sua fé seria estúpido o suficiente para, de forma consciente, adorar o que acredita ser apenas um pedaço de pão. Pode até ser considerado um culto equivocado, mas ainda assim é bastante piedoso e não idólatra, assim como nós, católicos, diríamos que o culto luterano ou anglicano é piedoso e bem-intencionado, ainda que, na verdade, careça da Presença Real (devido aos prooblemas com reseito a ordenação e sucessão apostólica). Não é idólatra – apenas equivocado quanto à metafísica.
Onde está o pecado na adoração de Jesus Cristo, nosso Senhor, Salvador e Redentor – o Deus Filho? Achamos que Ele está verdadeiramente presente nos elementos consagrados. Lutero também achava. Se somos idólatras, ele também é. Lutero era até conhecido por se curvar em adoração. Os luteranos também acreditam que Jesus Cristo está verdadeira e substancialmente presente após a Consagração, então por que não são habitualmente acusados de idolatria? Constitui a essência da idolatria partir do coração, da alma e da vontade. Se alguém substitui Deus por outra coisa, trata-se de uma decisão interior. Tem que ser; caso contrário, tudo ficaria reduzido a ações robóticas de um agente sem livre-arbítrio. Este tipo de coisa é pressuposto também no Sermão do Monte, onde Jesus mostra como todos os pecados começam nos nossos corações: o ódio é a semente do assassinato, a luxúria é o cerne do adultério, etc. Todo pecado é assim (pelo menos o pecado pelo qual somos responsáveis).
Idolatria é a adoração de um falso deus. Isso não acontece na Missa, porque todos entendem que Jesus, e não o pão e o vinho, está sendo adorado eucaristicamente. A própria palavra transubstanciação prova isso. Quanto a se tratar de uma questão de coração e alma: a Bíblia estabelece isso, penso eu:
Isaías 66: 3 – como aquele que bendiz a um ídolo. Estes escolheram os seus próprios caminhos, e a sua alma se deleita nas suas abominações.
Ezequiel 14:4-5 – Portanto, fala-lhes, e dize-lhes: Assim diz o Senhor Deus: Qualquer homem da casa de Israel que tem ídolos instalados no coração e conserva diante dos olhos o que o faz cair no pecado, vir ter com um profeta, eu mesmo, o Senhor, lhe responderei segundo a multidão dos seus ídolos, a fim de atingir no coração essa casa de Israel, que, por amor aos seus ídolos, se tem afastado de mim.
Ezequiel 20:16 -porque rejeitaram as minhas leis, abandonando os meus preceitos, profanando os meus sábados; pois seu coração seguiu após seus ídolos. (cf. Ezequiel 36:25; Senhor 46:11)
Outro motivo bíblico é o desgosto de Deus pelos homens que “servem” aos ídolos (disposição que vem do coração e da vontade: 2 Reis 17:12; 2 Reis 21:21; 2 Crônicas 24:18; Salmos 106:36; Ezequiel 20:39; 1 Tessalonicenses 1:9). São Paulo situa de forma categórica a idolatria na disposição interior:
Romanos 1:21, 24-25 – Porque, conhecendo a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças. Pelo contrário, extraviaram-se em seus vãos pensamentos, e suas mentes insensatas foram obscurecidas.[1] Por isso Deus os entregou, nas concupiscências dos seus corações, à impureza, de modo a desonharem os seus corpos entre si, porque trocaram a verdade de Deus pela mentira e adoraram e serviram a criatura em vez do Criador, que é bendito para sempre! Amém.
A palavra para “mentes” em Romanos 1:21 é kardia (“coração”: a base de “cardíaco”), e é frequentemente traduzida como “coração” ou “corações” em outras traduções. A mesma palavra aparece em Romanos 1:24, onde é traduzida como “corações” na RSV. Na KJV é traduzida como “coração” todas as 158 vezes que aparece (de acordo com a Concordância de Young). A inscrição da Enciclopédia Católica para “Idolatria” também me apoia:
A culpa da idolatria, contudo, não deve ser avaliada apenas pela sua natureza abstrata; a forma concreta que assume na consciência do pecador é o elemento mais importante. [ver, J. Wilhelm, “Idolatria”, Enciclopédia Católica, (Nova York: Robert Appleton, 1913)]
A idolatria é uma disposição interna – a adoração consciente de algo diferente de Deus e a substituição de Deus por uma criatura ou objeto inanimado.
Notas
[1] Na Bíblia Ave Maria, temos: “e se lhes obscureceu o coração insensato”.
Créditos da Imagem: Moisés quebra as Tábuas dos Dez Mandamentos em resposta à adoração do bezerro de ouro (1860),
xilogravura de Julius Schnorr von Carolsfeld (1794-1872) [domínio público / Wikimedia Commons]
