Hoje é a Festa em que celebramos a concepção de Maria sem mancha do pecado original. No meu post sobre o assunto do ano passado, respondi a três pontos comuns de confusão:
- A I.C. significa que Maria não tinha livre-arbítrio? Não, não significa que Maria não tinha livre-arbítrio. Pelo contrário, achamos que ela tinha mais livre-arbítrio do que eu e você. Pense nisso: quem é mais livre para usar ou não drogas, o viciado ou o não viciado? Quatro pessoas na história: Jesus, Maria, Adão e Eva, foram criadas ou concebidas sem pecado original. Elas são como crianças que crescem sem exposição às drogas. Adão e Eva se envolveram e ficaram viciados. Todos os seus filhos (ou seja, todos nós) são “bebês do crack”, por assim dizer, no sentido de que nascemos com um desejo pelo pecado. Tanto Jesus (porque Ele é Deus) quanto Maria (pelo poder do Espírito Santo, em razão de uma graça singular) foram libertos desse desejo. É possível que Maria tivesse se perdido no pecado de qualquer maneira, como Eva fez, mas ela não se perdeu. Os Padres da Igreja pensavam em Maria como a Nova Eva, a Eva invertida. Eva tomou o fruto do pecado da árvore para dar ao primeiro Adão. Maria tomou o fruto do seu ventre (Lucas 1:42), o “último Adão” (1 Cor. 15:45), e permitiu que Ele fosse feito pecado, e colocado em um madeiro (Gal. 3:13). Ela também é comparada com a Arca da Antiga Aliança (veja Apocalipse 11:19-12:5). Eva não tinha pecado original, e, se não fosse por sua transgressão, teria permanecido sem pecado; a Arca foi fabricada totalmente pura.
- Isso não faz de Maria uma deusa? Não. Eva não era uma deusa, e nós não seremos deuses e deusas no Céu, mesmo quando estivermos sem pecado e participando da natureza Divina. Só porque alguém compartilha da natureza Divina e não tem pecado, não significa que seja digno de adoração — na verdade, uma vez aperfeiçoados, não desejaremos adoração para nós mesmos.
- Maria precisava de um Salvador? Com certeza, e em Lucas 1:46 ela diz isso. Mas há duas maneiras de ser salvo de um poço: você pode ser puxado para fora (como nós somos), ou você pode ser pego antes de cair nele (como Maria foi). Ela merecia herdar o pecado original: Deus a salvou dele. Para dar um exemplo que li ontem: existem medicamentos antirretrovirais atualmente que podem ajudar a garantir que mães HIV-positivas deem à luz bebês HIV-negativos. Você diria que esses bebês foram salvos da AIDS? Claro! Eles são salvos não pela maneira normal que imaginamos (sendo curados), mas sendo impedidos de contrair a doença que eles, se não fosse pelos medicamentos, teriam certamente contraído.
Este ano, mencionarei apenas mais duas perguntas que ouvi sobre o assunto. A primeira (ou quarta, dependendo de como você está contando), é uma que as pessoas costumam perguntar: “Se Maria não tinha pecado, ela não poderia ter tomado o lugar de Cristo na cruz?” E a resposta é não. A ofensa do pecado contra o Deus eterno exigiu mais do que a ausência de pecado para expiá-la. Caso contrário, São Miguel ou qualquer um dos anjos do céu poderia ter encarnado em vez de Jesus. Não, o sacrifício expiatório tinha que ser o próprio Deus eterno e todo-poderoso. Esta também é a resposta para a última pergunta: “Como os méritos de Cristo poderiam ter preservado Maria do pecado quando Ele ainda não havia morrido?” A resposta é que Cristo é eterno e existe fora do tempo. Ele entra na história na Encarnação, mas também a transcende. Por esta razão, os méritos de Cristo se aplicam àqueles que morreram na fé antes da Paixão. É esta a maneira como Abraão e os justos mortos foram preservados do sofrimento, mesmo “antes” da Morte de Cristo na Cruz (veja Lucas 17:22-24). Lembre-se de que o salário do pecado não é apenas a morte terrena, mas o sofrimento no Inferno. Abraão era culpado de pecados (Gênesis não tem vergonha de mencioná-los), mas tinha uma fé salvadora. Por seus próprios méritos, ele deveria estar sofrendo juntamente com o homem rico de Lucas 17 no Hades. Mas ele não estava, e isso se deve apenas à Morte expiatória de Cristo… ainda que, a partir de uma perspectiva histórica, ela ainda não tivesse acontecido. Isso se dá porque a Paixão de Cristo, por sua própria natureza, está dentro e além do tempo, já que é um evento histórico que culminou na Morte e Ressurreição do Autor do Tempo.
Sobre as motivações da Igreja Primitiva, leia mais aqui.
Giovanni Battista Salvi da Sassoferrato (1609–1685)
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